sábado, 28 de junho de 2008

Cem anos de João Guimarães Rosa


Água da palavra
Água calada, pura
Água da palavra
Água de rosa dura
Proa da palavra
Duro silêncio, nosso pai

Margem da palavra
Entre as escuras duas
Margens da palavra
Clareira, luz madura
Rosa da palavra
Puro silêncio, nosso pai


(Caetano Veloso)


"Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo. Eu sofria já o começo de velhice — esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, não ia, mais dia menos dia, fraquejar do vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo, em tororoma e no tombo da cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha tranqüilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse — se as coisas fossem outras. E fui tomando idéia.. "


A terceira margem do rio - João Guimarães Rosa - do livro: Primeiras Estórias

sexta-feira, 27 de junho de 2008

A queima dos livros


Quando o Regime ordenou que queimassem em público
Os livros de saber nocivo, e por toda a parte
Os bois foram forçados a puxar carroças
Carregadas de livros para a fogueira, um poeta
Expulso, um dos melhores, ao estudar a lista
Dos queimados, descobriu, horrorizado, que os seus
Livros tinham sido esquecidos. Correu para a secretária
Alado de cólera e escreveu uma carta aos do Poder.
Queima-me! escreveu com pena veloz, queima-me!
Não me façais isso! Não me deixes de fora! Não disse eu
Sempre a verdade nos meus livros? E agora
Tratais-me como um mentiroso! Ordeno-vos:
Queimai-me!

(Bertold Brecht)

Acendeu a luz e leu
leu e a luz
se acendeu.

(Joaquim Pedro Barbosa, poeta mineiro)
Imagem: Torre de Livros - Pinacoteca do Estado de São Paulo

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Urashima Taro

Podem haver outros vínculos entre Brasil e Japão, vínculos fortes, culturais, gastronômicos, sociais, econômicos, dentre tantos. Esse vídeo (Urashima Taro) é o recorte para o meu vínculo pessoal e afetivo com o Japão; a minha memória de infância, quando ainda pensávamos o Japão como 'escondido' em algum lugar do outro lado da terra, depois de algum buraco profundo, que se cavássemos muito, encontraríamos.

...é a minha homenagem aos 100 anos da Imigração Japonesa no Brasil.

Parabéns!!

Imagem: Joel Gonçalvez (Colagem com palha de arroz - Festival do Japão Nipo-Brasil).

terça-feira, 17 de junho de 2008

Nunca é tarde...


Quando no cais só fica ancorada
A indiferença e já não resta nada
Senão as ilusões a que te agarras.

Ouve a voz inefável das guitarras
Tingindo de paixão a madrugada
No fim duma viagem povoada
Do canto indecifrável das cigarras.

Saberás então que há sempre um começo
No profano rio em que a vida arde,
E é nessa maré viva que estremeço.

Mas, ainda que saibas que nunca é tarde,
Não tardes, que sem ti eu anoiteço,
E não peças jamais ao rio que aguarde.

Antônio Tomé, poeta moçambicano. Imagem: Rio Mondego, Coimbra.

sábado, 14 de junho de 2008

Pessoa Ilustre 1888 -1935


Eu amo tudo que foi,
Tudo que já não é,
A dor que já não me dói.
A antiga e a errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi e voou
E hoje é já outro dia.

**

Saudades, só portugueses
Conseguem senti-las bem
Porque têm essa palavra
Para dizer que as têm

Fernando Pessoa 13/06/1888

sexta-feira, 13 de junho de 2008

“Parabéns”


Os brinquedos não serão os mesmos...
Meu Filho completa hoje 13 anos e essa mensagem é pra ele. São os meus ‘parabéns’.
Um dia vi um filme em que a mãe, numa situação de perda do filho, conta que ele cresceu e ela não se deu conta; lamenta que ela não o conhecia, não sabia seus gostos, suas preferências... sequer sabia a sua música favorita. Aquilo me marcou muito, porque eu me reportei a mim mesma e pensei: será que eu sei qual é a música favorita do meu filho? Foi um sinal de alerta e a partir de então, procuro estar mais atenta a ele, mais presente mesmo.
Ele gosta de música, de vídeo game, de tocar guitarra, de estar com os amigos, de futebol...tem gostos semelhantes aos meninos da sua idade.
Fico olhando pra ele quando está com os amigos; gosto de vê-los conversando. Eles falam numa linguagem própria, usam roupas parecidas, gestos, que são os códigos próprios da ‘identidade’ na qual querem ser reconhecidos.
Fico olhando pra ele quando está com a irmã, como se relacionam, demonstram afeto, brigam, discordam em algumas coisas, concordam em outras, riem juntos... admiro ver como têm cumplicidade e revelam pertencer a um universo próprio também, fraterno e de laços profundos.
Repenso sempre o meu papel de mãe: em como, às vezes, sou provedora, outras vezes, sou conselheira, outras sou só brava, sem conversa... noutras vezes me desculpo...
Olho pra ele quando me despeço de manhã e ele ainda dorme...Olho pra ele quando fala comigo...quando nos abraçamos e fortalecemos nossa proximidade. Algumas vezes sou durona, do tipo mãe má. Rigorosa mesmo. Acredito numa educação com alguns limites.
Mas o meu amor por ele não têm medida.
Meu filho é assim, pessoa de riso fácil, é solidário, é boa companhia, enche a casa com a sua presença... É único, singular, ao mesmo tempo que é igual a tantos outros, com seus sonhos comuns e brincadeiras de menino.
Tem uma frase que gosto muito, que diz algo do tipo: ‘os homens não deixam de brincar porque envelhecem, mas envelhecem porque deixam de brincar’.
Aos 13 anos, eu desejo muitas coisas boas ao meu filho, mas sobretudo que ele nunca deixe de brincar, mesmo que os brinquedos não sejam sempre os mesmos.
Parabéns, Baby.

Besinhos

Dedico a você a música ‘Sweet child o’mine’. (para ouvir, clique no “Parabéns”)

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Recado (Meu namorado)

Mandei um recado
Pro meu namorado
Nos classificados
De um grande jornal
Pedindo pra ele
Que um dia apareça
Antes que eu me esqueça
E melhore
O astral
Meu namorado é um sujeito ocupado
Não manda notícias
Nem dá um sinal
Eu ando meio com medo
Que um dia ainda ache
A tristeza normal

Pensei num caminho
Que fosse seguro
Num bom casamento
Na vida do lar
Eu sou do subúrbio
E sei que o destino prá nós é bem simples
Não vai variar

O tempo me dado
Pra andar nessa terra
É um tempo de guerra
Um tempo cruel
Até os amores
São tão mal cuidados
Que acabam virando
Uma coisa banal

(Renato Teixeira)
Parabéns aos namorados, pelo dia de hoje.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Parabéns!!




Amor é um fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Luis de Camões

sábado, 7 de junho de 2008

Campinas realiza Festival do Japão ‘especial’ para o centenário



"Há praticamente um mês do tão esperado centenário da imigração japonesa no Brasil, a Associação Cultural Nipo-Brasileira de Campinas antecipa o "dia 18" para este fim de semana, com o já tradicional "Festival do Japão", que chega à quarta edição.

"Estamos correndo bastante para deixar tudo preparado, mas posso garantir que, dentro das nossas limitações de espaço, teremos tudo para agradar o público de todas as idades", revela o presidente da Nipo Campinas, Tadayoshi Hanada.

O evento, que reúne várias associações nipo-brasileiras da região - Okinawa, Tozan, Pedra Branca, Macuco e a Regional da Seicho-no-ie -, e faz parte do Calendário Oficial da Prefeitura de Campinas, será realizado nos dias 7 e 8 de junho, das 10 às 20 horas.

Segundo os organizadores, durante os dois dias, haverá shows de música, apresentação de taikô, danças típicas, artes marciais, exposição de acervo sobre imigração, salão de artes, concurso de "Miss Festival do Japão", praça de alimentação e estandes de produtos orientais e de patrocinadores."

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Há ventos que vêm por bem...


"Os moinhos da Serra da Atalhada(Portugal) foram feitos com a parte de cima giratória de modo a poderem direccionar as pás das velas no sentido do vento que mais lhes favorecesse o movimento..."
Foto e texto:Rodrigo Silva

terça-feira, 3 de junho de 2008

Saudades

Saudades! Sim... talvez... e por que não?...
Se o sonho foi tão alto e forte
Que pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah, como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como o pão.

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar
Mais doidamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais saudade andasse presa a mim!

Florbela Espanca (Livro De Sóror Saudade).


A Meio Pau

Queria mais um amor. Escrevi cartas,
remeti pelo correio a copa de uma árvore,
pardais comendo no pé um mamão maduro
- coisas que não dou a qualquer pessoa -
e mais que tudo, taquicardias,
um jeito de pensar com a boca fechada,
os olhos tramando um gosto.
Em vão.
Meu bem não leu, não escreveu,
não disse essa boca é minha.
Outro dia perguntei a meu coração:
o que há durão, mal de chagas te comeu ?
Não, ele disse: é desprezo de amor.

Adélia Prado

Foto: 'mal me quer, bem me quer' - Alberto Viana (olhares.com)

domingo, 1 de junho de 2008

Para viver um grande amor


Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso - para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher... - não tem nenhum valor.

Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro - seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada - para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado pra chatear o grande amor.

Para viver um grande amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe amor sem fieldade - para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vaidade é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.

Para viver um grande amor, 'il faut' além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô - para viver um grande amor.

Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito - peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista - muito mais, muito mais que na modista! - para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...

Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs - comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica, e gostosa, farofinha, para o seu grande amor?

Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto - pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente - e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia - para viver um grande amor.

É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao diz-que-diz-que - que não quer nada com o amor.

Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva escura e desvairada não se souber achar a bem-amada - para viver um grande amor.

(Vinítius de Moraes)

“Você está com medo da morte?”. E Vinícius, placidamente, respondeu: “Não, meu filho. Eu não estou com medo da morte. Estou é com saudades da vida."
*Foto: "O que é o amor?" Catarina Paramos