quarta-feira, 26 de maio de 2010

A alma do outro é uma floresta escura*

Com um mover da fronte ele descarta
tudo o que obriga, tudo o que coarta,
pois em seu coração, quando ela o adentra,
a eterna Vinda os círculos concentra.

O céu com muitas formas Ihe aparece
e cada qual demanda: vem, conhece -.
Não dês às suas mãos ligeiras nem
um só fardo; pois ele, à noite, vem

à tua casa conferir teu peso,
cheio de ira, e com a mão mais dura,
como se fosses sua criatura,
te arranca do teu molde com desprezo.



O anjo, de Rainer Maria Rilke* - Tradução de Augusto Campos
Imagem: Releitura Escultura Pinacoteca.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

"O fado me conquistou de forma muito lenta"


António Zambujo - Dono de uma carinha de bom-menino e também de uma linda e doce voz. Ele é tudo de bom, de A a Z....

“O fado foi algo que me conquistou de forma muito lenta” e assim, enraizou e permanece. Eu continuo a cantar no Senhor Vinho, sempre que posso.

- É fundamental para um fadista frequentar estes ambientes?- Não sei se é fundamental. Eu acho que depende de cada um. Eu pessoalmente gosto muito de lá cantar e uso muito a casa de fados como uma sala de ensaios para experimentar coisas novas.

Trecho da entrevista com António Zambujo - Disponível em: http://www.vidas.xl.pt/noticia.aspx?channelid=B084AE37-6177-48AB-AEDA-956F51C029B5&contentid=9E959719-9550-4702-84B8-1E403D73D0FD

Mais do Melhor:

http://www.antoniozambujo.com/home.asp?zona=5&template=4&precedencia=0&idioma=1

http://www.espelhodecultura.pt/

http://www.youtube.com/watch#!v=17kybz09gkw

sábado, 15 de maio de 2010

Apelo

vem
que eu sei que você tem vontade que eu sei que você tem saudade de mim antes que haja enfermidade que eu não me recupere mas se decidir fazer surpresa deixei as chaves embaixo do xaxim comprei os doces que devora acho que agora não vai resistir um espelho pra sua vaidade dossel pena de ganso é quase um romance desligue nossos celulares três dias pra um começo vem vem eu sei que você tem vontade eu sei que você tem saudade de mim antes que haja enfermidade que eu me desespere
vem
Música: Vem - Vanessa da Mata disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=MPNHEe-nM5M

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Corinta, Obrigada pelo carinho.


"... a água corre com saudade do que nunca teve: o total, imenso mar."
Mia Couto


São os pequenos gestos que nos enchem o coração de alegria.
Imagem: Por do sol na praia de Guaecá por Corinta Geraldi

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Vou contar tudo pra minha mãe...


Essa frase é velha conhecida. Comum na infância do 'meu tempo' quando estávamos nos anos iniciais da antiga escola primária, era comum pronunciarmos nas situações de conflito.
A função desse enunciado era polivalente. Nos fortalecia perante o adversário ao nos revestir de uma retaguarda com muito mais poder de fogo do que nós. Franzinos, pequenos e briguentos por qualquer motivo (uma figurinha, uma bolinha de gude, um pedacinho de lanche diferente, um carrinho feito de tampinhas de refrigerante e latinha de 'massa de tomate') fosse na rua, na volta da escola ou até nas confusões em casa, nas habituais brigas com os outros irmãos e irmãs mais velhos que cuidavam dos mais novos enquanto os pais cumpriam as suas jornadas na roça.
A frase poderosa também colocava mais um elemento na briga, elemento esse que, mesmo sendo a responsável por nossa educação e o fazia com rigor, ao evocarmos a figura materna, ela entrava como a valente, a poderosa, a vingativa, jogando por terra toda a sua tentativa de fazer de nós pessoas de bem. Muitas vezes, ela nem chegava a tomar conhecimento do conflito em que nos metíamos e intimidava, por certo o adversário, porque no auge do sentimento de injustiça, havíamos profetizado: a coisa não ia ficar assim...
Com o passar do tempo, à medida em que fomos nos revestindo dos vernizes sociais, as frases carregadas de efeito que usávamos na infância foram sendo substituídas por outras que nos configuram como pessoas crescidas e menos rabugentas.
Adulta, família constituída e morando distante da casa materna, muitas vezes me percebi ainda dependente, senão da frase, mas da atitude: ir à casa da minha mãe e 'contar tudo'.
Algumas vezes enfatizando em como a vida tem me feito vítima de injustiças ou aquelas causadas por mim própria; as situações em que me sinto enfraquecida e frágil, perante inimigos simbólicos e outros sentimentos bons como os sucessos alcançados no dia a dia, as alegrias das conquistas dos filhos, etc... ao contar tudo pra minha mãe, exteriorizava e os reconfigurava... Ao ouví-la, ia elaborando uma troca e os sentimentos, de pesados, se convertiam em leveza, como se, ao me aconselhar, me ouvir, me elogiar, me criticar, ela tirasse de minhas costas, uma a uma, as pedras que a vida ia colocando... O resultado era que eu voltava de lá mais leve, com um bem estar que não sei descrever.
Celebrar o dia das mães em casa de minha mãe como fizemos ontem, conserva essa aura onde encontro energia semelhante no abraço fraterno dos meus irmãos e irmã. Eles mantém na casa um ambiente acolhedor onde o passar das horas se dá entre boas conversas, as lembrancas e a comida caseira. Retorno melhor, sempre melhor do que vou - renovada e fortalecida.
Já, agora, sem a mãe, impera um sentimento profundo que alterna ausência e presença.
Imagem: 1981 - Seu Kide, Dona Kelé e Dade. Americana, SP.