
"Aos treze anos da minha idade, e três da sua, separamo-nos, o meu cajueiro e eu. Embarco para o Maranhão, e ele fica. Na hora, porém, de deixar a casa, vou levar-lhe o meu adeus. Abraçando-me ao seu tronco, aperto-o de encontro ao meu peito. A resina transparente e cheirosa corre-lhe do caule ferido. Na ponta dos ramos mais altos abotoam os primeiros cachos de flores miúdas e arroxeadas como pequeninas unhas de crianças com frio.
- Adeus, meu cajueiro! Até à volta!
Ele não diz nada, e eu me vou embora.
Da esquina da rua, olho ainda, por cima da cerca, a sua folha mais alta, pequenino lenço verde agitado em despedida. E estou em São Luís, homem-menino, lutando pela vida, enrijando o corpo no trabalho bruto e fortalecendo a alma no sofrimento, quando recebo uma comprida lata de folha acompanhando uma carta de minha mãe: "Receberás com esta uma pequena lata de doce de caju, em calda. São os primeiros cajus do teu cajueiro. São deliciosos, e ele te manda lembranças..."
Há um Cajueiro ao lado do estacionamento, no prédio da Faculdade de Educação, na Unicamp. Não sei se as pessoas que passam por ali, diariamente, o reconhecem. Ele está entre outras plantas, árvores diversas, frutíferas e ornamentais.
Comigo, foi amor à primeira vista, logo que o identifiquei entre as tantas árvores daquele espaço. Isso já vem há alguns anos e sempre dedico um tempo a olhá-lo detalhadamente. Um observador atento perceberia que lanço um olhar de ternura a ele: o seu tronco, as suas folhas, as suas cores...
Também a minha relação com o texto é muito especial: ele fez parte das minhas leituras de adolescente e eu lembro que o li muitas vezes, que até o sabia 'decor'. Eu incorporava aquela tristeza da despedida e me emocionava com a generosa oferta dos doces feitos com o caju que ele produzira...e confesso que ainda me emociono... Entretanto e curiosamente, eu nunca havia visto, ao vivo, as flores de um cajueiro.
Hoje, qual não foi a minha surpresa... eu vi que ele está carregado de flores, como essas que o poeta descreve: 'cachos de flores miúdas e arroxeadas como pequeninas unhas de crianças com frio'. Examinei-as, cuidadosamente, pra conferir se a imagem que construí na adolescência, correspondia à realidade.
E não é que parecem mesmo!!
A imagem postada não corresponde às flores do cajueiro da Unicamp, mas fico devendo e ainda vou trazer fotos dele e postar aqui.
O cajueiro de Humberto de Campos, plantado pelo poeta na sua infância, ainda é vivo e tem mais de 100 anos.