terça-feira, 30 de setembro de 2008

Hai...


mostro o passaporte
minha sombra espera
depois da fronteira

George Swede
imagem:  "nós, na madeira" (por mim)

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Haikai



juntos na hera
mãe e filho tesouram
a primavera

sábado, 27 de setembro de 2008

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Mudar dói...

...não mudar, dói mais ainda.
(Oswaldo Montenegro)

Lilás


Amanhã
Outro dia
Lua sai
Ventania abraça
Uma nuvem que passa no ar
Beija
Brinca
E deixa passar
E no ar
De outro dia
Meu olhar

Surgia nas pontas
De estrelas perdidas no mar
Pra chover de emoção
Trovejar...
Raio se libertou
Clareou
Muito mais
Se encantou
Pela cor lilás
Prata na luz do amor
Céu azul
Eu quero ver
O pôr do sol
Lindo como ele só
E gente pra ver
E viajar
No seu mar
De raio.

Lilás, Djavan.
Imagem: Iris, por mim.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Fosse


Seria
pior
não
mais nem menos
indiferentemente mas tanto quanto

Stéphane Mallarmé, cujo verdadeiro nome era Étienne Mallarmé, (Paris, 18 de Março de 1842 - Valvins, 9 de Setembro de 1898) foi um poeta e crítico literário francês.
Imagem: Indiferente, mas nem tanto - por mim.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Lá vai Lisboa...

Palavras para uma cidade

 "Tempo houve em que Lisboa não tinha esse nome. Chamavam-lhe Olisipo quando os Romanos ali chegaram, Olissibona quando a tomaram os Mouros, que logo deram em dizer Aschbouna, talvez porque não soubessem pronunciar a bárbara palavra. Quando, em 1147, depois de um cerco de três meses, os Mouros foram vencidos, o nome da cidade não mudou logo na hora seguinte: se aquele que iria ser o nosso primeiro rei enviou à família uma carta a anunciar o feito, o mais provável é que tenha escrito ao alto Aschbouna, 24 de Outubro, ou Olissibona, mas nunca Lisboa. Quando começou Lisboa a ser Lisboa de facto e de direito? Pelo menos alguns anos tiveram de passar antes que o novo nome nascesse, tal como para que os conquistadores Galegos começassem a tornar-se Portugueses… Estas miudezas históricas interessam pouco, dir-se-á, mas a mim interessar-me-ia muito, não só saber, mas ver, no exacto sentido da palavra, como veio mudando Lisboa desde aqueles dias. Se o cinema já existisse então, se os velhos cronistas fossem operadores de câmara, se as mil e uma mudanças por que Lisboa passou ao longo dos séculos tivessem sido registadas, poderíamos ver essa Lisboa de oito séculos crescer e mover-se como um ser vivo, como aquelas flores que a televisão nos mostra, abrindo-se em poucos segundos, desde o botão ainda fechado ao esplendor final das formas e das cores. Creio que amaria a essa Lisboa por cima de todas as cousas. 

Fisicamente, habitamos um espaço, mas, sentimentalmente, somos habitados por uma memória. Memória que é a de um espaço e de um tempo, memória no interior da qual vivemos, como uma ilha entre dois mares: um que dizemos passado, outro que dizemos futuro. Podemos navegar no mar do passado próximo graças à memória pessoal que conservou a lembrança das suas rotas, mas para navegar no mar do passado remoto teremos de usar as memórias que o tempo acumulou, as memórias de um espaço continuamente transformado, tão fugidio como o próprio tempo. Esse filme de Lisboa, comprimindo o tempo e expandindo o espaço, seria a memória perfeita da cidade. 

O que sabemos dos lugares é coincidirmos com eles durante um certo tempo no espaço que são. O lugar estava ali, a pessoa apareceu, depois a pessoa partiu, o lugar continuou, o lugar tinha feito a pessoa, a pessoa havia transformado o lugar. 

 [...] o espírito de Lisboa sobrevive, e é o espírito que faz eternas as cidades. Arrebatado por aquele louco amor e aquele divino entusiasmo que moram nos poetas, Camões escreveu um dia, falando de Lisboa: “…cidade que facilmente das outras é princesa”. Perdoemos-lhe o exagero. Basta que Lisboa seja simplesmente o que deve ser: culta, moderna, limpa, organizada – sem perder nada da sua alma. E se todas estas bondades acabarem por fazer dela uma rainha, pois que o seja. Na república que nós somos serão sempre bem-vindas rainhas assim." 

Palavras para uma cidade - José Saramago  in http://www.josesaramago.org/Entrada_Fundacao.aspx;   (Filho e neto de camponeses, José Saramago nasceu na aldeia de Azinhaga, província do Ribatejo, no dia 16 de Novembro de 1922).  

Imagem: Lá vai Lisboa: por mim.

domingo, 21 de setembro de 2008

Primavera.



Pensar em Deus é desobedecer a Deus,
Porque Deus quis que o não conhecêssemos,
Por isso se nos não mostrou...


Sejamos simples e calmos,
Como os regatos e as árvores,

E Deus amar-nos-á fazendo de nós
Belos como as árvores e os regatos,
E dar-nos-á verdor na sua primavera,

E um rio aonde ir ter quando acabemos!...


Imagem: "Generoso, Gerânio" - por mim.
Ricardo Reis (1887 - 1935?): nasceu no Porto. Educado em colégio de jesuítas, é médico e vive no Brasil desde 1919, pois expatriou-se espontaneamente por ser monárquico. É latinista por educação alheia, e um semi-helenista por educação própria 

sábado, 20 de setembro de 2008

Suave é viver só.




Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

Odes de Ricardo Reis
Imagem: Verdes texturas, por mim.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

À Carolina,


Querida, ao pé do leito derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro.

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
Que, a despeito de toda a humana lida,
Fez a nossa existência apetecida
E num recanto pôs um mundo inteiro.

Trago-te flores, - restos arrancados
Da terra que nos viu passar unidos
E ora mortos nos deixa e separados.

Que eu, se tenho nos olhos malferidos
Pensamentos de vida formulados,
São pensamentos idos e vividos.

Machado de Assis - Joaquim Maria Machado de Assis, neto de escravos alforriados, pobre e epiléptico, nascido em 21 de junho de 1839, no morro do Livramento, Rio de Janeiro)
Imagem: Amarílis, por mim.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

e Tins...


[...] quem sofre
Sempre tem que procurar
Pelo menos vir achar
Razão para viver...

Ver na vida algum motivo
Prá sonhar
Ter um sonho todo azul
Azul da cor do mar...

(imagem: Ubatuba; música: Azul da cor do mar - Tima Maia)

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Bens...

Eu quero aproximar
O meu cantar vagabundo
Daqueles que velam
Pela alegria do mundo...

Indo mais fundo
Tins e bens e tais!
Indo mais fundo
Tins e bens e tais!


(Fragmento de 'Podres poderes' - Caetano Veloso; música: Ive Brussel de Jorge Benjor) 

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Anunciando a Primavera II.

eu
(é primavera)
te amo.









(imagem: uma certa flor; fragmento da música: Primavera de Tim Maia)

domingo, 7 de setembro de 2008

Ali estava o azul do mar...


“[...] uma coisa é engarrafar a água do mar; outra é engarrafar o azul das ondas. O que você quer do mar não é água salgada, quer o azul. Não dá pra botar numa garrafa. Você tem que levar a essência, o valor”.

Eu lia entrevista com Tião Rocha na Revista Caros Amigos, que o Guilherme gentilmente sugeriu e encontrei, nesse recorte, um outro sentido para o Festival Literário que realizamos no sábado, na escola. 

Era sábado após o almoço. Chegavam para o Festival aqueles que poderiam ser mães, avós, pais, irmãos menores, amigos ou vizinhos. Pessoas que raramente se vê, naquele momento percorriam espaços de um território protegido. Vinham, portanto, cautelosos e apreensivos. 
Cruzavam com as gentes da escola que, no corre-corre, tentavam finalizar a exposição dos trabalhos, deixando indefinida a fronteira entre o término de um e o início de outro. 
Momento efêmero de darmos vistas ao que temos feito juntos - adultos, crianças e jovens.
Dentre as obras selecionadas que se enfileiram pelo corredor em varais, umas desvelam através de parlendas, os primeiros passos da leitura inferida. 
Em pequenos textos, de quando a escrita já dá mostras de ser um ato de coragem, em que as primeiras letras desafiantes buscam um percurso criando o caminho no próprio caminhar, outros já demonstram repertório de escrita e de literatura;
Outros ainda, os textos coletivos, retrato solidário de quem viveu junto certas emoções e que se reuniu em roda pra recontá-las (porque têm muito o que dizer), são registros de episódios que ficarão na memória de um currículo muito maior, que não pertencerá à escola, mas à infância.
Nas paredes, desenhos e colagens; cartazes e painéis de diversos tamanhos e formas rompem com o branco-azul-igual de todo dia. 
Do teto descem móbiles de bois-bumbás, ímpares na expressão e acabamento, mesmo recobertos de mesma chita; 
Em contraste com as grades de ferro, a leveza das espirais dos boitatás mudam de cor ao vento e não oferecem medo, mas simpatia;
Do mesmo teto e ao mesmo vento, os grandes painéis se agitam e denunciam em sua vitalidade, a intimidade da adolescência com sua maneira própria de ver o mundo, revelando gostos, desgostos, prazeres e angústias nos textos e nos desenhos; 
São meninos e meninas tão iguais em jeitos e gestos, tão diferentes em suas histórias de vida, muitas vezes desconhecidas, por nós;
Ao sol escaldante do pós-almoço que ardia a quadra, optamos pelo grande salão, decorado com livros de literatura infantil. Cuidadosamente embalados, exibem-se frente-e-verso e bailam no ar provocativos tal qual iguaria, que apetece e atrai por ser desconhecida, prazerosa e inusitada. 
Abrimos com o Hino Nacional. 
Sem mastro, improvisamos um ponto na parede e instalamos a Bandeira (com todo respeito) e dois meninos se alternam pra mantê-la visível ao público enquanto cantamos. 
Postei-me na extrema diagonal do espaço reservado pra ser o ‘palco’. 
Com a visão privilegiada de todos os presentes eu vi olhos brilharem ao som das músicas e ao movimento das danças apresentadas pelas crianças e jovens. Era muito mais do que representar bem os movimentos e falas ou músicas ensaiadas;
Eram crianças e jovens vivendo e promovendo emoções; 
Eu vi risos e lágrimas. Orgulho. Emoção contagiante;
Eu vi corpos que se movimentavam, querendo sair de si; 
Eu vi os flashes das máquinas tentando capturar momentos fortuitos. 
Eu vi...E me emocionei.
Não sei quantos eram, daqui ou de lá, quem era palco, quem era platéia...
Seguramente, pra esses sujeitos, esse projeto de escola teve sentido. 
Quem veio, quem viu, provou, não apenas a água salgada, mas pode levar nos olhos o verdadeiro azul do mar.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

(Não) Somos todos escritores...


“É um drama comum a todo e qualquer escritor este sentimento de que estamos vivendo, sim, mas essa vida se destina somente a acumular experiências para a obra literária. Já a quase totalidade das pessoas se limita a viver porque não dispõe de linguagem.

Trago um mistério inicial em minha biografia: por que logo eu, numa família de onze, revelou a vocação e o destino para a escrita, numa família que não tinha pendores literários?

Sempre tenho a impressão de que toda a vida de um escritor é estuário onde se acumula a matéria que se transformará em obra literária.

O escritor é, então, uma pessoa condenada não a viver, mas a escrever."

Lêdo Ivo.
Imagem: Saco da Ribeira, Ubatuba.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Escrever é carregar água na peneira*




Prêmio Portugal Telecom de Literatura em Língua Portuguesa 2008

Parabéns à Portugal Telecom por mais esta ação de incentivo à escrita e parabéns aos brasileiros, portugueses, moçambicanos e angolanos, pelos 'despropósitos'.
Nossa língua...somos nós.


(* Do livro "Exercícios de Ser criança. Manoel de Barros/Imagem: logo da campanha disponível em: http://www.premioportugaltelecom.com.br/2008/index.asp)