domingo, 31 de maio de 2009

Fado!

Meu amor, abre a janela
que eu vou passar junto dela
quando chegar a tardinha
mas não chames o meu nome
porque a saudade encontrou-me
e eu posso não estar sozinha
Prendi no peito uma flor
que diz mais do meu amor
do que promessas sem fim
mas não venhas a correr
que ninguém deve saber
o que tu sentes por mim
E depois não tenhas medo
que eu sei amar em segredo
e vou passar de mansinho
sem levantar a cabeça
pra que ninguém me conheça
tu podes não estar sozinho
Só quando a noite cair
é que me atrevo a subir
para te pôr na lapela
a flor da minha saudade
mas como o frio nos invade
meu amor, fecha a janela
!
MEU AMOR ABRE A JANELA - Letra: Tiago Torres da Silva/ Música: Armando Machado (Fado Santa Luzia)
Vídeo:
http://www.youtube.com/watch?v=oYlvQ6Z2hsU
Imagem: Janela da Casa de Amália Rodrigues, Lisboa - Portugal - 2008

sábado, 30 de maio de 2009

As Folhas Mortas

Agradeço e retribuo a um amigo:
Oh, eu queria tanto que você se lembrasse,
Dos dias felizes quando nós éramos amigos,
Nesse tempo, a vida era mais bela,
E o sol queimava mais que hoje.
As folhas mortas são colhidas com uma pá.
Você vê, eu não me esqueci.
As folhas mortas são colhidas com uma pá,
As lembranças e os arrependimentos também,
E o vento do norte as leva,
Na noite fria do esquecimento.
Você vê, eu não me esqueci,
Da canção que você cantava...
É uma canção que parece com a gente,
Você que me amava, eu que te amava.
Nós vivíamos, os dois, juntos,
Você que me amava, eu que te amava.
E a vida separa aqueles que se amam,
Levemente, sem fazer barulho.
E o mar apaga, sobre a areia,
Os passos dos amantes separados.
Nós vivíamos, os dois, juntos,
Você que me amava, eu que te amava.
E a vida separa aqueles que se amam,
Levemente, sem fazer barulho.
E o mar apaga, sobre a areia,
Os passos dos amantes separados..."


Les feuilles mortes - Tradução: Fernando Dollyman
Escrita em 1945 por Jacques Prévert (1900-1977), com música do compositor húngaro Joseph Kosma (1905-1969) e interpretação de Yves Montand (1921-1991) em 1981 no Olympia de Paris.
Imagem: Raízes - Marilene Simão de Alcântara - Brasília - http://br.olhares.com/raizes_foto1448193.html

quinta-feira, 28 de maio de 2009

"Servir é a maior das artes"


Numa das primeiras cenas de A vida é bela, o aprendiz de garçom Guido Orefice procura a melhor inclinação do torso para saudar os clientes: 45 graus, à maneira das garrafas de champanhe? Ou talvez mais? De tão esforçado, inclina a cabeça até o chão. É quando recebe uma lição do tio e mestre: "Servir é a maior das artes" e, como tal, escapa a todo servilismo. Eis a chave das proezas do garçom: transportado com o filho para um campo de concentração, Guido leva ao virtuosismo a arte de servir sem subserviência. (1)

Se você pesquisar a expressão: PODER PÚBLICO, encontra, dentre outras, essa definição: "Poder público é o conjunto dos órgãos com autoridade para realizar os trabalhos do Estado, constituído de Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário.
A expressão é utilizada também no plural (poderes públicos), também chamados de poderes políticos. Em sentido amplo, representa o próprio
governo, o conjunto de atribuições legitimadas pela soberania popular."(2)

O que temos presenciado na GREVE - movimento organizado e legítimo dos trabalhadores municipais de Campinas é a concretização do entrelaçamento desses dois conceitos. Somos nós, servidores, que estamos com a 'mão na massa' e que, de fato, temos carregado a cidade nas mãos, a duras penas, em favor dos cidadãos e zelando pelo patrimônio construído com o dinheiro público.Nessa arte, servimos, sem servilidade, sem nos curvarmos aos desmandos da administração, exercendo, com coerência o nosso PODER PÚBLICO na condução das nossas atribuições.



EL MONTE Y EL RÍO(3)

En mi patria hay un monte.
En mi patria hay un río.

Ven conmigo.

La noche al monte sube.
El hambre baja al río.

Ven conmigo.

Quiénes son los que sufren?
No sé, pero son míos.

Ven conmigo.

No sé, pero me llaman
y me dicen: "Sufrimos".

Ven conmigo.

Y me dicen: "Tu pueblo,
tu pueblo desdichado,
entre el monte y el río,

con hambre y con dolores,
no quiere luchar solo,
te está esperando, amigo".

Oh tú, la que yo amo,
pequeña, grano rojo
de trigo,
será dura la lucha,
la vida será dura,
pero vendrás conmigo.



Venham conosco e sigamos mais fortes, que a nossa luta é legítima.

(3) -Los versos del capitán - Pablo Neruda
Imagem: Trabalho e movimento - Marcos Persico - Bahia, Brasil.

terça-feira, 26 de maio de 2009

O mar, a coroa e o Cara

A moeda, da colecção "A Língua Portuguesa", será distribuída pelas tesourarias das instituições de crédito e do Banco de Portugal, anunciou a instituição. A Casa da Moeda está autorizada a cunhar até 150 mil exemplares.
“Tentei encontrar os autores que podiam simbolizar com maior eficácia a língua portuguesa numa pesquisa com o apoio de Natividade Pires, especialista em literatura”, professora no Instituto Politécnico de Castelo Branco, disse o escultor José Simão, colega da docente no estabelecimento de ensino superior. Com o perfil de Fernando Pessoa surge na moeda a inscrição repetida da frase “A Minha Pátria é a Língua Portuguesa”, e, no reverso, a imagem de Camões e as legendas “Língua Portuguesa” e “Património Cultural”. “Camões e Pessoa levaram a nossa língua além fronteiras. Tentei cruzar isso com a nossa diáspora, que é o transporte da cultura e da língua”, explicou o autor.
Assim, o mar é o elemento comum às duas faces da moeda, ao lado das representações de Camões e Pessoa. “Os dois poetas viajaram, primeiro eles, depois os seus livros. E há um escudo que é levado pelas ondas” numa das faces da moeda, descreveu José Simão. “Esse escudo é a língua portuguesa, mas é o povo português que vai nessa viagem. Estamos todos ali simbolizados”, sublinhou.
Esta é a quinta moeda do escultor, desenhada no seu ateliê em Castelo Branco, onde reside.

Imagem: Nova moeda de coleção de 2,5 euros que entra em circulação. Fernando Pessoa e Camões foram escolhidos pelo escultor José Simão para ilustrá-la.

GREVE II


"Estamos em Greve já há 6 dias, por reposição salarial, pelo fim do nepotismo, contra os desmandos do poder, por melhoria nas condições de trabalho e estruturais em todo serviço público campineiro. Na última rodada de negociação ocorrida dia 25/05/2009 às 15 horas, ele além de não comparecer à mesa de negociação, manda seus secretários oferecer os mesmo 0% de reposição da inflação, 0% da reajuste no bônus e 3% de ?aumento? nos vencimentos. Mais uma vez assistimos uma queda de braço dos donos do poder contra o povo. " http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2009/05/447630.shtml
Sucesso ao movimento que a cada dia se fortalece.
Imagens disponibilizadas por Lurdinha.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Aos colegas do movimento paredista


[...]Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho e nossa casa,
rouba-nos a luz e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
[...]

Corrigindo: Esse trecho é parte da poesia de Eduardo Alves da Costa e indevidamente havia sido atribuído a Vladimir Maiakóvski. Obrigada às colegas Mafê e Pity pela correção.
EDUARDO ALVES DA COSTA - Niterói, RJ, 1936 - Nota: Poema publicado no livro 'Os Cem Melhores Poetas Brasileiros do Século', organizado por José Nêumanne Pinto, pag. 218.
http://www.umacoisaeoutra.com.br/literatura/falsos.htm

domingo, 24 de maio de 2009

Simplicidade, curiosidade e ironia


"Quando a erva crescer em cima da minha sepultura,
Seja esse o sinal para me esquecerem de todo.
A Natureza nunca se recorda, e por isso é bela.
E se tiverem a necessidade doentia de interpretar a erva verde sobre a minha sepultura,
Digam que eu continuo a verdecer e a ser natural."

Fernando Pessoa (é o autor, mas curiosa ou insensivelmente, não teve esse privilégio).

Não fui à procura de Van Gogh nem de Fernando Pessoa. Fui à procura do túmulo do pintor Willian Hogart, que tem em sua lápide uma linda mensagem, citada no filme 'The Mother' (http://www.sonyclassics.com/themother/core/hasflash.html). Não encontrei. Entretanto, cheguei a esse blog que me despertou a curiosidade pelo olhar artístico com que o autor trata a arte tumular. http://tumulosfamosos.blogspot.com/


Imagem: Túmulo de Van Gogh e do seu irmão Theo.
PERSONALIDADE: Vincent Willem van Gogh (Groot Zundert, 30 de Março de 1853 — Auvers-sur-Oise,França, 29 de Julho de 1890) foi um pintor pós-impressionista neerlandês, freqüentemente considerado um dos maiores de todos os tempos.
BIOGRAFIA: Sua vida foi marcada por fracassos. Ele falhou em todos os aspectos importantes para o seu mundo, em sua época. Foi incapaz de constituir família, custear a própria subsistência ou até mesmo manter contactos sociais.
ARTE TUMULAR: Uma simples lápide de mármore onde está gravado o seu nome. Vinte anos depois os restos mortais do seu irmão Theo, morto em 1891, foram transladados para um túmulo do lado de Van Gogh.
LOCAL: Cemitério da cidade de Auvers-sur-Oise, na França.
http://tumulosfamosos.blogspot.com/search/label/VAN%20GOGH-11-%20Pintor

terça-feira, 19 de maio de 2009

Por entre pedras


Ser inteiro custa caro.
Endividei-me por não me dividir.
Atrás da aparência, há uma reserva de indigência,
a volúpia dos restos.
Parto em expedição às provas de que vivi.
E escavo boletins, cartas e álbuns
- o retrocesso da minha letra ao garrancho.
O passado tem sentido se permanecer desorganizado.
A verdade ordenada é uma mentira.
O musgo envaidece as relíquias. Os dedos retiram as teias,
assisto à revoada de insetos das ciladas.
Fujo da claridade, refulge a poeira.
O par de joelhos na imobilidade de um rochedo.
Reviso o testamento, alisando a textura
como um gramático da seda.
Desvendo o que presta pelo som do corte.
O que ansiava achar não acho
e esbarro em objetos despossuídos de lógica
que me encontram antes de qualquer pretensão.
O que fiz cabe numa caixa de sapatos.
Colecionava talhos de madeira, bonecos
adornados com a ponta miúda do canivete.
Lá estava um dos sobreviventes, desfocado,
vizinho das medalhas escolares
e dos parafusos condoídos de ferrugem.
Um auto-retrato não seria tão fidedigno.
Eu era aquela frincha de chão florido, casca e húmus.
Quantas foram as miudezas que não combinavam
com o conjunto e, na falta de harmonia,
abandonei no depósito da infância?
E se faltou confiança para restaurá-las ao convívio,
faltou coragem para excluí-las em definitivo.
Somos o desperdício do que estocamos.
Não aprendemos a desaprender.
Não doamos nada, nem a palavra passamos adiante.
O porão tem vida própria e respira
o que jogamos fora.
O que refugamos na ceia volta a nos mastigar.
Tudo pode fermentar: o forro, os passos, o odor do braço.
Tudo pode nascer sem o mérito do grito,
como um murmúrio ou estalar de um abraço.


Tudo pode nascer, ainda que abafado.

Fabrício Carpinejar: http://www.fabriciocarpinejar.blogger.com.br/

sábado, 16 de maio de 2009

"Arte na França 1860-1960: O Realismo"


"A arte não dorme nos leitos preparados para ela...ama o desconhecido. Os seus melhores momentos são quando esquece como se chama".
Jean Dubuffet
Imagem: 'Mulher com Cão" - Gustave Courbet
ARTE NA FRANÇA 1860-1960: O REALISMO
MASP - MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO
de 15/05 até 28/06
Cerca de 120 obras, 36 delas da Coleção de Joe Berardo, de Lisboa.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Salut Marin


Salut marin bon vent à toi
Tu as fait ta malle, tu a mis les voiles
Je sais que tu n'reviendras pas
On dit que le vent des étoiles
Et plus salé qu'un alizé
Et plus salé qu'un alizé
Plus entétant qu'un mistral
Plus entétant qu'un mistral
Au revoir marin, tu vas manquer
Au revoir marin, tu vas manquer
Tes yeux bleus, ton air d'amiral

Salut marin bon vent à toi
J'te dis bon vent mais ça m'fait mal
Car marin tu emportes avec toi
Toute notre enfance de cristal
Et notre jeunesse de miel
Et notre jeunesse de miel
Et tous nos projets d'arc en ciel
Et tous nos projets d'arc en ciel
Et du Cap Horn à Etretat,
Du Havre aux plages de Goa
L'horizon à toi se rappelle

Vous, les marins, vous êtes ainsi
Vous ne savez rien d'autre que partir
Vous, les marins, vous êtes cruels
Vous nous laissez au large de vos souvenirs
Vous, le marins, vous êtes sans coeur
Vous préférez la mer à vos amours
Et les sirènes de chaque port
À vos mères, à vos femmes et à vos soeurs.

La vie marin passe sans bruit
Comme autrefois tout en secoussses
Quelquefois c'est la houle et le roulis
Et quelquefois la vague est douce
Alors je fais comme il se doit
Alors je fais comme il se doit
Je vis tranquille au bord d'un précipice
Tranquille au bord d'un précipice
Marin tu serais fier je crois
Marin tu serais fier je crois
Je vis de faze, le vent aux trousses
Tout comme toi.

Marinheiro
Saudação, marinheiro, bom vento a você
Fizeste a tua mala, puseste as velas
Sei que você não retornará
Diz-se que o vento das estrelas é mais salgado que um
tropical
Mais inebriante que um vento do norte
Adeus, marinheiro, vais fazer falta
Os teus olhos azuis, o teu ar de almirante

Saudação, marinheiro, bom vento a você
Te digo "bom vento" mas isso me faz mal
Porque, marinheiro, você me leva com você
Toda nossa infância de cristal
E a nossa juventude de mel
E todos os nossos projetos de arco-íris
E do Cabo Horn à Etretat
De Havre às praias de Goa
O horizonte recorda-se de você

Você, marinheiro, é assim
Não sabe nada além de partir
Vocês, os marinheiros, são cruéis
Deixam-nos fora das vossas lembranças
Vocês, marinheiros, são sem coração
Preferem o mar aos vossos amores,
E as sirenes de cada porto às vossas mães, às
vossas
mulheres e ás vossas irmãs.

A vida marinha passa sem barulho
Como em outros tempos, tudo em movimentos suaves
Às vezes é a ondulação e o giro
e às vezes a onda é suave.
Então faço como se deve
Vivo tranqüilo à beira de um precipício
Marinheiro, você estaria orgulhoso, eu creio
Vivo em agitação, o vento "aos pacotes"
Da mesma maneira que você.


Composição: Carla Bruni


terça-feira, 12 de maio de 2009

Cuidado, Frágil!


Cheguei em casa chateada, no retorno da aula. Dei boa noite aos filhos e enquanto me desvencilhava da bolsa, sacola, apostilas, etc... alarmei:
- Gente, vocês não fazem ideia do que me aconteceu hoje, na aula da Corinta.
Fizeram carinhas de surpresa e de dozinha da mãe, porque quando faço essa introdução, já sabem que em seguida vem algum fracasso. Sem mais suspense, entrei logo no assunto, dizendo que na aula a professora nos contou como eram confeccionados os ovos de Páscoa no seu tempo de infância, em sua cidade, no Rio Grande do Sul. Ao contar, ela foi ilustrando a conversa nos mostrando os ovinhos que ela e o Vanderlei (seu esposo e professor também) tinham feito. Dentro da embalagem comum de ovos, havia ovinhos decorados, cada um de um jeito diferente e o que tinham em comum é que, ao serem oferecidos, traziam em si a demonstração de carinho a alguém de quem se gosta. Destacou que alguns haviam sido feitos especialmente para os seus orientandos e que os demais seriam sorteados entre os presentes. Nem preciso dizer que eles anteciparam que a contemplada fui eu, com um ovinho a escolher: todos bonitinhos, pintados com esmalte de unha de diferentes cores e formas e recheados com amendoim moído. Empolgada com o resultado do sorteio, escolhi o que me chamou mais a atenção: cheio de florzinhas coloridas, que tinha sido feito pelo Vanderlei. Contei passo a passo da minha alegria ao ganhar aquele mimo, do cuidado que tive com ele e de como o meu sentimento se equilibrava entre o medo imenso de derrubar (então eu o apertava) e o medo que ele quebrasse (então eu afrouxava a mão). Era uma pequena jóia. Porém, não demorou muito e...
Ah, sim, ia me esquecendo: tive tempo de fazer uma espécie de ninho com dobradura de folha de caderno e encaixei-o para que ficasse ainda mais seguro, sem que rolasse ou trincasse em minha mão. Enquanto cuidava para segurar o ovinho na dose certa, equilibrava o caderno, a caneta e fazia as anotações sobre a aula. Claro que lembro pouco da aula porque só pensava no momento de chegar em casa e mostrar aos pimpolhos o produto da minha sorte. É pena, mas durou pouco a minha alegria de tê-lo ganho.
Nem sei como dizer, mas ele saltou do ninho...como em câmera lenta...fui acompanhando o seu percurso, da mão até sua explosão no chão... revelando o conteúdo e o odor delicioso do recheio de amendoim. Foi magnífico. Ele realmente caiu com classe, explodindo em cacos e em cores, semelhante aos fogos de artifícios no céu...mas em direção oposta. E eu... fiquei perplexa entre o vexame dos maus tratos com o presente (tão cobiçado) e a frustração de chegar em casa sem ter o ovinho inteiro para representar o trabalho dos professores e quanto de história havia ali, concentrada naquele pequeno território. Murmúrios de lamento... e seguiu a aula.
Não era o caso de interromper a explicação da professora e atrair pra mim a atenção.
Os sentimentos de vexame, de megera, de mal agradecida, de 'mico', já tinha sido o bastante e foram só meus. Em termos. Solidariamente, minha amiga Edna veio em meu socorro, juntando os cacos, literalmente e me auxiliando na recolha dos fragmentos, enquanto as colegas próximas me confortavam dizendo: Não ligue, afinal, você teve o gosto de ganhar, de tê-lo nas mãos... Contive o choro e lamentei com elas. De lembrança, levei algumas amostras das florzinhas, nos pedacinhos que consegui juntar. Do recheio de amendoim, sobrou só a memória do cheirinho...
Encerrei meu relato, cercada pelos filhos, num forte abraço e a exclamação resignada: êh, mãe...
Ciclo encerrando, pensei eu. Mas os filhos foram mais adiante (surpreendam-se também!).
No dia de Páscoa, recebi uma caixinha de papel, artesanalmente elaborada e ao abrir....dois ovinhos, que seguramente passaram por um processo semelhante de carinhosa elaboração, coloridos e recheados com paçoca. Do lado de fora, um bilhete com a recomendação:
CUIDADO, FRÁGIL.

domingo, 10 de maio de 2009

Homenagem às mães


Mãe: Alô?
Filha: Mãe? Posso deixar os meninos contigo hoje à noite?
Mãe: Vai sair?
Filha: Vou.
Mãe: Com quem?
Filha: Com um amigo.
Mãe: Não entendo porque você se separou do teu marido, um homem tão bom…
Filha: Mãe! Eu não me separei dele! ELE que se separou de mim!
Mãe: É… você me perde o marido e agora fica saindo por aí com qualquer um…
Filha: Eu não saio por aí com qualquer um. Posso deixar os meninos?
Mãe: Eu nunca deixei vocês com a minha mãe, para sair com um homem que não fosse teu pai!
Filha: Eu sei, mãe. Tem muita coisa que você fez que eu não faço!
Mãe: O que você tá querendo dizer?
Filha: Nada! Só quero saber se posso deixar os meninos.
Mãe: Vai passar a noite com o outro? E se teu marido ficar sabendo?
Filha: Meu ex-marido!! Não acho que vai ligar muito, não deve ter dormido uma noite sozinho desde a separação!
Mãe: Então você VAI dormir com o vagabundo!
Filha: Não é um vagabundo!!!
Mãe: Um homem que fica saindo com uma divorciada com filhos só pode ser um vagabundo, um aproveitador!
Filha: Não vou discutir, mãe. Deixo os meninos ou não?
Mãe: Coitados… Com uma mãe assim…
Filha: Assim como?
Mãe: Irresponsável! Inconseqüente! Por isso teu marido te deixou!
Filha: CHEGA!!!
Mãe: Ainda por cima grita comigo! Aposto que com o vagabundo que ta saindo contigo você não grita.
Filha: Agora tá preocupada com o vagabundo?
Mãe: Eu não disse que era vagabundo!? Percebi de cara!
Filha: Tchau!!
Mãe: Espera, não desliga! A que horas vai trazer os meninos?
Filha: Não vou. Não vou levar os meninos, também agora não vou mais sair.
Mãe: Não vai sair? Vai ficar em casa? E você acha o que, que o príncipe encantado vai bater na tua porta? Uma mulher na tua idade, com dois filhos, pensa que marido está assim fácil? Se deixar passar mais dois anos, aí sim que vai ficar sozinha a vida toda! Depois não vai dizer que não avisei! Eu acho um absurdo, na tua idade você ainda precisar que EU te empurre para sair!

Texto:Luis Fernando Veríssimo

Imagem: http://br.olhares.com/speotyto_cunicularia_coruja_buraqueira_foto1776462.html

segunda-feira, 4 de maio de 2009

O seu olhar



O seu olhar lá fora
O seu olhar no céu
O seu olhar demora
O seu olhar no meu

O seu olhar seu olhar melhora
Melhora o meu

Onde a brasa mora
E devora o breu
Como a chuva molha
O que se escondeu

O seu olhar seu olhar melhora
Melhora o meu

O seu olhar agora
O seu olhar nasceu
O seu olhar me olha
O seu olhar é seu

O seu olhar seu olhar melhora
Melhora o meu

O Seu Olhar - Arnaldo Antunes Composição: Paulo Tatit / Arnaldo Antunes

domingo, 3 de maio de 2009

Amor, então,




Amor, então,
também, acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima.


Poesia: Paulo Leminski

sábado, 2 de maio de 2009

Movimento dos Barcos




Estou Cansado E Você Também
Vou Sair Sem Abrir A Porta
E Não Voltar Nunca Mais
Desculpe

A Paz Que Lhe Roubei
E O Futuro Esperado

Que Nunca Lhe Dei
É Impossível Levar

Um Barco Sem Temporais
E Suportar A Vida Como Um Momento

Além Do Cais
Que Passa Ao Largo Do Nosso Corpo
Não Quero Ficar Dando Adeus
Às Coisas Passando
Eu Quero É Passar Com Elas
E Não Deixar Nada Mais

Do Que Cinzas De Um Cigarro
E A Marca De Um Abraço No Seu Corpo
Não, Não Sou Eu Quem Vai Ficar

No Porto Chorando
Lamentando

O Eterno Movimento Dos Barcos

Movimento Dos Barcos: Jards Macalé e Capinam



Imagem: Cais - Pereira Lopes, em: http://br.olhares.com/cais_foto587911.html

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Trabalho...


honesto, voluntário, manual, em equipe, avulso, rural, braçal, alienado, assalariado, temporário, científico, em física, infantil, artístico, escravo, de parto, humano...
"O trabalho é, em primeiro lugar, um processo de que participam igualmente o homem e a natureza, e no qual o homem espontaneamente inicia, regula e controla as relações materiais entre si próprio e a natureza. Ele se opõe à natureza como uma de suas próprias forças, pondo em movimento braços e pernas, as forças naturais de seu corpo, a fim de apropriar-se das produções da natureza de forma ajustada às suas próprias necessidades. Pois, atuando assim sobre o mundo exterior e modificando-o, ao mesmo tempo ele modifica a sua própria natureza.
[...]Pressupomos o trabalho em uma forma que caracteriza como exclusivamente humano. Uma aranha leva a cabo operações que lembram as de um tecelão, e uma abelha deixa envergonhados muitos arquitetos na construção de suas colmeias. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor das abelhas é que o arquiteto ergue a construção em sua mente antes de a erguer na realidade. Na extremidade de todo processo de trabalho, chegamos a um resultado já existente antes na imaginação do trabalhador ao começá-lo. Ele não apenas efetua uma mudança de forma no material com que trabalha, mas também concretiza uma finalidade dele próprio que fixa a lei de seu modus operandi, e à qual tem de subordinar sua própria vontade."(MARX, Karl,O capital, I, p. 197-198, grifos meus)



Um Homem Nunca Chora (José Craveirinha)
Acreditava naquela história
do homem que nunca chora.
Eu julgava-me um homem.
Na adolescência
meus filmes de aventuras
punham-me muito longe de ser cobarde
na arrogante criancice do herói de ferro.
Agora tremo.
E agora choro.
Como um homem treme.
Como chora um homem!

Um homem também chora (Gonzaguinha)
Um homem também chora
Menina morena
Também deseja colo
Palavras amenas
Precisa de carinho
Precisa de ternura
Precisa de um abraço
Da própria candura
Guerreiros são pessoas
São fortes, são frágeis
Guerreiros são meninos
No fundo peito

Precisam de um descanso
Precisam de um remanso
Precisam de um sono
Que os tornem refeitos
É triste ver, meu homem
Guerreiro menino
Com a barra de seu tempo
Por sobre seus ombros
Eu vejo que ele berra

Eu vejo que ele sangra
A dor que tem no peito
Pois ama e ama
Um homem se humilha
Se castram seu sonho
Seu sonho é sua vida
E vida é trabalho
E sem o seu trabalho
Um homem não tem honra
E sem a sua honra
Se morre, se mata
Não dá pra ser feliz



Não dá pra ser feliz

http://br.geocities.com/poesiaeterna/poetas/mocambique/josecraveirinha.htm#Um Homem Nunca Chora
Gonzaguinha:Um Homem Também Chora(Guerreiro Menino,1983.
Imagem: Verde, amarelo: a vida no arame. Férias no SESC, janeiro 2009.