quinta-feira, 24 de julho de 2008

Os tais cinquenta anos.


Há muito abandonamos a tradição de se 'puxar as orelhas', tantas vezes quantos forem os anos que se comemora, no dia do aniversário.
Ainda bem. Assim fosse, teria eu hoje, a orelha vermelha e dolorida.
Fazer cinquenta anos é um privilégio; como uma pedra atirada no lago plácido, provocando ondas... fazer cinquenta é poder olhar a vida de maneira flexível, elástica, que se expande em vários níveis, gêneros, graus e âmbitos: político, social, histórico, ecológico, afetivo, familiar e transitar por eles, todos juntos ou separados; significa ter sobrevivido às duras penas impostas pelos anos frios da ditadura; significa gozar de algumas liberdades, dentre elas, a de ser seletiva e escolher os poucos amigos que se mantiveram próximos, mesmo distantes, durante essa média jornada; significa pensar 'como os nossos pais', na educação dos filhos e ponderar o que se deseja manter e o que se descarta, e que, no meu caso, infelizmente já não são vivos para aconselhar, contestar ou concordar comigo; significa ser de uma geração que teve poucas fotos de infância, assim, nesse momento, fico devendo aquela, em preto e branco pra revelar um pouco do modelo de infância que vivi... Asseguro que foi alegre, com mais liberdade e contato com uma natureza ainda genuína de cidade do interior, com cheiro da roça, de chuva, de estrume, de fruta fresca, de verdura arrancada da terra no cio, de pão caseiro, de macarrão com frango aos domingos...vida rural da qual ainda trago doces lembranças impregnadas na memória da mente, da pele, de todos os sentidos...

A memória não é linear, então ao mesmo tempo que volto à infância, outros marcos se apresentam como pontos relevantes na minha vida, momentos registrados pela importância que tiveram: a vida em família, a alegria de ser de uma família grande e ter irmãos e irmãs...brincar e brigar... a vida escolar... adolescência longa...vida adulta tardia...

Ter cinquenta anos me confere o privilégio de ter sido adolescente até por volta dos vinte anos, dada a lentidão da vida naquele tempo e por conseguinte, amadurecer por volta dos trinta, que foi quando me casei e constitui família. Alguns marcos que representam degraus e revelam conquistas, desfilam na mente para serem captados e eu os apanho um a um: conclusão de curso, entrada na universidade, nascimento dos filhos, aniversários, casamento.. Contudo, vivi outros não menos felizes como o fim do casamento, as perdas de entes queridos, decepções amorosas, desafetos...

Ser uma cinquentona é poder olhar pra vida como a 'Ponte de San Luis' estendida sobre o abismo; ali colocada, para ser atravessada belamente, impetuosamente... amparada pela experiência e projetada pela ousadia de, ao se soprar as velinhas, querer da vida que ela não se acabe ali...

Fazer cinquenta é poder ter um espaço para agradecer aos cumprimentos, sejam eles virtuais ou reais, vindos de amigos e de familiares. Fica aqui o meu abraço fraterno e o agradecimento a todos que de alguma maneira estão comigo no 'ter, no ser e no fazer.

Um comentário:

  1. Fazer 50 anos é um marco na vida de qualquer pessoa , ainda estou longe dessa data mas sinceramente espero chegar aos meus 50 anos com a força e o carácter da autora do post.
    Lembro-me de em criança fazer contas em que ano eu iria fazer 50 e que o resultado era algo muito,muito distante e que agora esta quase ao dobrar da esquina .
    Lendo o post anterior e este, facilmente se pode concluir que mais importante que a idade é podermos viver com tranquilidade e com aqueles que amamos e nos amam para que nos seja possível desfrutar das coisas boas que a vida nos vai dando, independentemente da nossa idade física.
    Estou certo que nos meus 50 anos irei escrever um post onde vou fazer um flash-back como o da autora terá contornos diferentes pois os passados são diferentes, mas vai fazer uma forte referencia a uma luta travada nos meus 43,44 anos e se querem uma pista sobre essa mesma luta , o que posso dizer é que o meu post dos 50 anos vai ser escrito ao som duma cachoeira sentada num alpendre duma casa rodeada de arvores e na companhia da autora deste blog .
    Parabéns pelos dois posts , excelentes !

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